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Mercados por TradingView

Selic: uma porta escancarada

22 de março de 2018
Escrito por Ignacio Crespo
Tempo de leitura: 6 min
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O BC cortou a Selic, de 6,75% para 6,50%, após evolução “benigna” da inflação.

Em fevereiro (dia 7), o BC havia afirmado: “o cenário básico para a inflação tem evoluído, em boa medida, conforme o esperado”. Hoje, dia 21 de março, o BC alterou esta avaliação, e reconhece que “o cenário básico para a inflação evoluiu de forma mais benigna que o esperado nesse início de ano”. Esta foi uma mudança importante: o BC – e a maioria dos investidores, diga-se de passagem – foi surpreendido por uma inflação mais baixa neste início de 2018. Para quem tiver dúvidas, basta comparar as projeções de inflação, do Relatório de Inflação de dezembro/2017, com aquilo que foi, de fato, observado até aqui.

Neste contexto, “a evolução do cenário básico tornou adequada a redução da taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual nesta reunião”. Isto é uma mudança relevante frente àquilo que disse no início de fevereiro, quando afirmou que era “mais adequada a interrupção do processo de flexibilização monetária”. Esta mudança foi, aos poucos, precificada pelo mercado, e não foi uma surpresa o BC levar a Selic de 6,75% para 6,50%.

E para o Copom de maio?

Aqui, certamente, a “grande” surpresa de hoje: o BC deve a levar a Selic para 6,25%. Ou seja: mais 1 corte de 25 pontos base vem por aí. Tal sinalização foi bastante clara: “Para a próxima reunião, o Comitê vê, neste momento, como apropriada uma flexibilização monetária moderada adicional”. Para quem esperava uma “porta praticamente fechada” para novos cortes, a comunicação do BC chamou a atenção. A porta ficou escancarada.

Afinal, segundo a instituição, um corte adicional “mitiga o risco de postergação da convergência da inflação rumo às metas”. Dito de outra forma: o BC acredita que juros mais baixos, hoje, podem evitar que a inflação continue, de forma prolongada, abaixo do centro da meta de inflação. Vale lembrar: o BC persegue o centro da meta, embora oscilações abaixo e acima deste valor sejam “aceitáveis” (considerando as bandas de 1,5 p.p. em torno do centro).

Quais são as projeções de inflação do BC?

O BC projeta¹ hoje um IPCA “em torno de 3,8% para 2018 e de 4,1% para 2019”. Estes números estão abaixo do centro das metas oficiais: 4,50% e 4,25%, respectivamente. Vale comparar: em fevereiro, o BC projetava para estes anos uma inflação “ao redor de 4,2%”.

Quais são os riscos atrelados a estas projeções?

Começamos pelo risco de a inflação ficar abaixo das projeções do BC. Neste caso, temos a “inércia” – mecanismo através do qual uma inflação baixa “hoje” é capaz de manter uma inflação baixa “amanhã”, e vice-versa. Do lado contrário, o BC destaca a “frustração das expectativas sobre a continuidade das reformas e ajustes necessários na economia brasileira”. Isto seria capaz de elevar os “prêmios de risco” (risco país, taxa de câmbio, etc.). Isto seria intensificado caso o cenário externo fosse revertido, por exemplo. Vale notar: ao contrário de fevereiro, já não destaca o risco de a inflação ficar baixa por conta de “possíveis efeitos secundários do choque favorável nos preços de alimentos e da inflação de bens industriais em níveis correntes baixos”.

A decisão do Copom de maio já está tomada?

Não. O BC continuará a avaliar o cenário. E fez um disclaimer clássico: “Essa visão para a próxima reunião pode se alterar e levar à interrupção do processo de flexibilização monetária, no caso dessa mitigação se mostrar desnecessária”. Ou seja: a Selic ir para 6,25% é o cenário mais provável neste momento, mas não deveria ser dado como uma certeza. De qualquer forma, será preciso alguma surpresa significativa, em nossa opinião, para que isto não aconteça.

E depois de maio? Como deve evoluir a Selic?

Para reuniões além da próxima (ou seja, a partir da reunião do Copom dos dias 19 e 20 de junho), “salvo mudanças adicionais relevantes no cenário básico e no balanço de riscos para a inflação, o Comitê vê como adequada a interrupção do processo de flexibilização monetária, visando avaliar os próximos passos, tendo em vista o horizonte relevante naquele momento”.

Ou seja: o cenário-base é a Selic continuar em 6,25%. Mas vale notar: não é impossível que a Selic volte a recuar. Em nossa opinião, a probabilidade disto é baixa (talvez uns 20%, para tentar dar uma ordem de grandeza a tal possibilidade). Já vimos que a inflação corrente, e o risco desta contaminar as expectativas de inflação, é algo que pode continuar a fazer o BC repensar os seus passos. Portanto, será importante continuarmos a monitorar as projeções de inflação para o final de 2018 e, com especial ênfase, para 2019 — período que começará a ganhar importância na análise.

Os recentes cortes de Selic – e, possivelmente, o próximo – são condizentes com o ritmo de recuperação econômica?

Sim. O BC manteve a avaliação de que “a conjuntura econômica prescreve política monetária estimulativa”. Ou seja, “taxas de juros abaixo da taxa estrutural”, hoje entre 4,5-5,5%, em nossa opinião. Aliás, dados recentes de atividade, ligeiramente abaixo do esperado, reforçaram tal avaliação do BC, neste início de 2018.

E quais são as perspectivas para a Selic no médio prazo?

Acreditamos que haverá uma normalização de juros, num futuro não muito distante. Afinal, a economia deve continuar em recuperação, e a inflação deve caminhar para o centro da meta. Com o passar do tempo, o “horizonte relevante da política monetária” passa a ser mais o de 2019, e menos o de 2018. Neste contexto, o nosso cenário-base contempla uma elevação gradual da Selic já no 1º semestre do próximo ano, indo rumo a um patamar entre 8-9% no final de 2019.

Vale notar: quanto mais cair a Selic no curto prazo, o “período prolongado” de juros baixos pode ser encurtado, em nossa opinião. Ou seja: até então, era crescente a nossa expectativa sobre uma “normalização” — ou seja, sobre uma alta gradual — da Selic apenas no final do 1º semestre de 2019. Agora, com novos cortes de juros e a possibilidade de a Selic cair ainda mais, este cenário perde um pouco de forças. Dito de outra forma: começa ser mais provável que o BC inicie a “normalização” da Selic já no início de 2019.

 

 

Observações:

1 Considerando o cenário com taxas de juros e câmbio extraídas do Boletim Focus. Para a Selic, hoje considera-se 6,50% para o final de 2018 e 8,00% para o final de 2019; em fevereiro, considerava-se uma Selic de 6,75% para o final de 2018 e 8,00% para o final de 2019. As taxas de câmbio são praticamente as mesmas: R$3,30 para 2018; em fevereiro, considerava-se R$3,40 para 2019; hoje, considera-se R$3,39 para 2019;

2 Todas as citações do BC, contidas neste texto, foram retiradas dos 2 últimos comunicados do Copom (dia 7 de fevereiro e dia 16 de março).

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