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Mercados por TradingView

O Estado e Mercado de mãos dadas em direção ao progresso

16 de abril de 2018
Escrito por Victor Candido
Tempo de leitura: 6 min
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Pilha de livros

“O Estado Empreendedor – Desmascarando o mito do setor público vs. setor privado”, Mariana Mazzucato, Penguim Portfolio – R$44,90. Esta é a resenha e indicação desta sexta-feira.

“Em visita recente aos Estados Unidos, o presidente francês François Mitterrand fez um passeio pelo Vale do Silício, na Califórnia (…) Durante o almoço, Mitterrand ouviu Thomas Perkins, sócio do fundo de capital de risco que lançou a Genenthc Inc, exaltar as virtudes dos investidores arrojados que financiam os empreendedores. Perkins teve a fala cortada por Paul Berg, professor da universidade de Stanford, ganhador do Prêmio Nobel pelo trabalho em engenharia genética. “Onde estavam vocês nas décadas de 1950 e 1960, quando foi preciso fazer todo o financiamento da ciência básica? A maioria das descobertas que têm alimentado a indústria foi feita nessa época.”

Em todo o livro não existe passagem mais marcante que essa que abre o Capítulo 3. Sim, este é um livro de passagens marcantes. Não é um romance e sim uma obra técnica sobre economia, porém extremamente acessível. Ideias fortes estão por todo o livro, no sentido de que Mazzucato ataca alguns conceitos enraizados no mainstream econômico de que o Estado é um leviatã burocrático, um monstro lento que só deve atuar de forma pontual a corrigir as poucas imperfeições que o mercado apresenta. Quando, na verdade, ele pode trabalhar em conjunto com o mercado e fornecer a base para a inovação e crescimento tecnológico, em uma importante relação simbiótica.

Apesar do livro já ter sido lançado a alguns anos, é importante resgatar suas ideias, ainda mais em um momento de polarização político-econômica no Brasil e no mundo, onde alguns grupos tentam impor a pura lógica do mercado enquanto outros defendem um Estado ainda maior para defender o povo, antagonismos burros. A leitura do livro da Mazzucato serve para mostrar que não existe um lado certo.

Mas, para entendermos como surge a inovação tecnológica, precisamos entender um pouco como os economistas enxergam o crescimento econômico. Não vou discorrer sobre todos os modelos analisados pela autora, acredito que apenas os modelos Solow-Swan e do crescimento endógeno nos ajude a formar uma boa ideia. Para Robert Solow o crescimento é uma simples função que combina capital físico (K) e trabalho humano (L) de forma a gerar um certo nível de produto (Y). Claro, com tudo mais constante e com retornos decrescentes a escala, o que significa que o aumento da quantidade de K ou L gera um crescimento cada vez menor em (Y). Logo, existe um limite no nível de produto que pode ser alcançado com essa combinação.

Y=F (K, L) a famosa função de produção.

Com tudo mais constante, a função descreve uma curva com rendimentos decrescentes. Assim, combinando K e L podemos nos ‘mover’ ao longo da curva, lembrando do limite imposto pelos retornos decrescentes. Porém, se retirarmos a pressuposição de tudo mais constante, podemos deslocar a curva ‘para cima’ e assim gerar mais produto (Y) com a mesma combinação de (K) e (L) que tínhamos anteriormente. O que desloca a curva é chegada de uma nova tecnologia, por exemplo, a máquina a vapor, na primeira revolução industrial, mostra como uma nova tecnologia pode aumentar a produção (Y). Porém Solow descobriu que 90% da variação da produção econômica é explicada por esse choque tecnológico e chamou isso de resíduo da mudança técnica. Dessa forma, notou-se que 90% do crescimento, então, é explicado por variáveis não inclusas no modelo. Logo, era preciso criar um modelo que embutisse os outros 90% que explicasse o crescimento.

gráfico de "O Estado Empreendedor - Desmascarando o mito do setor público vs. setor privado"

O modelo de crescimento, que incluía a mudança tecnológica, surgiu no começo dos anos 90. A teoria do novo crescimento, ou crescimento endógeno, colocou dentro da nossa função o investimento em P&D (pesquisa e desenvolvimento) e o investimento em capital humano (gastos em educação e treinamento). E esses dois últimos trazem retornos crescentes a escala, ou seja, expandem o limite de crescimento ao longo da função de produção. Logo, podemos crescer de forma maior e melhor desde que investimentos sejam feitos em pesquisa e educação. Essa última afirmação nos parece bastante óbvia, não é? Sim, porém o modelo utiliza as novas pressuposições acerca da pesquisa como endógenas a empresa, ou seja, o empresariado é o responsável por esse novo conhecimento e não o Estado, um erro como mostra Mazzucato.

Fica claro para nós que o grande motor do crescimento é a inovação tecnológica, independente do modelo que escolhemos para a análise. E aí surge a pergunta que Mazzucato parece inquieta em responder: qual a origem dessa inovação? E sua reposta é simples, ela basicamente do financiamento que o Estado fornece para pesquisa básica, que possui enorme risco, uma vez que, não se sabe quais tecnologias poderão emergir dessas pesquisas.

Mas o Estado não é panaceia na tecnologia, apesar dele arcar com os custos para a pesquisa básica. O mercado também tem importante papel, pois é ele quem vai transformar o substrato da pesquisa em tecnologias úteis e que possam ser consumidas por pessoas e empresas. O Estado financia o conhecimento, mas quem corre o risco para transformá-lo em algo realmente útil para as pessoas são os empreendedores. Mais uma vez, voltamos a relação simbiótica.

O programa espacial americano é um excelente exemplo de como o investimento do Estado em pesquisa básica nas décadas de 40 e 50 geraram o conhecimento que permitiu que dezenas de empresas contratadas pela NASA, pudessem transformar o conhecimento em equipamentos e aplicações úteis que permitiram o homem ir à Lua. Estado e mercado trabalhando juntos em prol de um objetivo que trouxe enormes benefícios para a humanidades.

Outro importante exemplo vem da empresa mais valiosa do mundo, a Apple, valendo cerca de 800 bilhões de dólares. A Apple não inventou do zero a tecnologia do Iphone, apenas juntou diversas tecnologias criadas em programas de pesquisa governamentais que foram criadas décadas antes em laboratórios do governo americano. Mas Jobs correu o risco de lançar os produtos inovadores antes de todos.

Outra indústria que se beneficia amplamente de pesquisas básicas financiadas pelo Estado é a farmacêutica. Marcia Angell, ex-editora da prestigiada revista acadêmica The New England Journal of Medicine, mostrou em seu livro The Truth About the Drug Companies (A verdade sobre a indústria farmacêutica) que todas as novas moléculas que poderiam se tornar medicamentos inovadores vieram de laboratórios governamentais ou financiados com dinheiro público. Porém, assim como na Apple, os laboratórios testaram as moléculas de forma a fazerem elas serem seguras o suficiente para se transformarem em medicamentos que pudessem ser usados no dia-a-dia de milhões de pessoas.

O Estado Empreendedor é um livro que vai fazer você pensar a relação entre Estado e Mercado, que ultimamente vem sendo colocados como antagônicos, quando na verdade deveriam ser parceiros, vivendo em perfeita simbiose, e não em uma guerra, como alguns grupos no Brasil (e no mundo também) tentam pintar. Apesar da autora pesar um pouco a mão para o lado benéfico do Estado, o livro ainda sim mostra que sem o mercado, nada, absolutamente nada, produzido nas universidades se tornaria útil.

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