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Negativo 0.1%: esse é o crescimento do PIB italiano acumulado nos últimos 10 anos. A oitava economia do mundo (uma posição à frente do Brasil) tem patinado faz tempo, mas recentemente a crise econômica que vem castigando o país recebeu um tempero de crise política colocando em dúvida a capacidade de União Europeia de contornar a situação e sacudindo os mercados financeiros do mundo inteiro.
O estopim da crise foi a nomeação do economista Carlo Cortarelli como primeiro ministro do país pelo presidente Sergio Mattarella. A Itália é uma democracia parlamentar, o presidente tem mandato de 7 anos (Mattarella assumiu em 2015) e uma de suas funções é apontar o primeiro ministro do país. Este por sua vez escolhe a sua equipe e todos precisam ser aprovados pelas duas câmaras, a dos deputados e a dos senadores. E aí que a situação começa a ficar complexa e difícil de entender até mesmo para nós brasileiros, que não somos principiantes e estamos acostumados ao surrealismo político.
As eleições parlamentares italianas aconteceram em março deste ano, depois que o presidente Mattarella dissolveu o parlamento em dezembro do ano passado. Nenhum partido conseguiu maioria, mas os dois mais votados foram o partido de extrema direita, a Liga, e o partido anti-establishment denominado 5 estrelas e fundado por um comediante italiano, o Beppe Grillo. Esses dois partidos, que apresentam tendências nacionalistas, populistas e anti-união europeia, decidiram se unir para formar uma coalizão e governar o país, o problema é que o primeiro-ministro proposto por Mattarella representou o oposto do que estes partidos defendem.
Economista do FMI, defensor da austeridade econômico, Cortarelli foi rechaçado pelo recém-empossado parlamento italiano e pediu para sair antes mesmo de entrar. Depois de muita gritaria, finalmente chegou-se a um nome de consenso, e em primeiro de junho, o professor de direito Giuseppe Conte, desconhecido da maioria e sem nenhuma experiência política foi indicado primeiro-ministro do país.
Seu discurso de posse não ajudou a acalmar o mercado. Conte propõe uma agenda “revolucionária” e considera populismo um elogio. Afirma entender o problema da dívida pública do país, estimado em mais de 130% do PIB (para título de comparação, o da Grécia é de 180% e o do Brasil de cerca de 80%), mas que essa questão será combatida com crescimento econômico e não com austeridade. Lembra bastante a nossa “nova matriz econômica”, capitaneada por Dilma Rousseff, Guido Mantega e sua trupe.
É possível ter empatia com a falta de paciência do povo italiano com a austeridade econômica. O país não cresce há mais de uma década, o desemprego de 11.2% é um problema sério e fica dramático entre os jovens: 33.1% dos italianos com menos de 25 anos está desempregado. Pior, o número de pessoas vivendo em pobreza absoluta aumentou para 4.74 milhões, ou 7.9% da população no final de 2016, o maior número desde que esse índice começou a ser medido em 2005. Como no Brasil, essa pobreza não é distribuída por igual no país, lá o Sul, bem mais pobre, concentra a pobreza e o desemprego, assim como a falta de esperança. Denúncias de corrupção em todas as esferas do governo também fazem parte do cotidiano italiano. Não é difícil entender porque a população deseja mudança.
Somado a tudo isso ainda tem a questão da zona do Euro. Os acordos da União Europeia foram criticados pelos dois partidos que agora governam a Itália que apelidam acordo econômico de “gaiola alemã”. No seu discurso de posse no Senado, Conte disse que sair do Euro não está em discussão, mas que o país pretende renegociar os parâmetros que ferem a autonomia do país em determinar a sua política econômica interna. Afirmou também que quer abrir o país para o comércio com a Rússia.
Difícil é saber se o novo primeiro-ministro terá força para negociar com o Banco Central Europeu, o ECB e ao mesmo tempo cortar os privilégios arraigados da elite política e econômica italiana, para que o país possa ter fôlego para voltar a crescer. Enquanto isso não ocorre, as taxas de juros no país continuam disparando, sendo que o título de 10 anos que estava sendo negociado abaixo de 1.8% no início do ano, chegou a ser cotado acima de 3.0% no final de maio.
Fonte: tradingeconomics.com
A questão não tem solução fácil. O ECB já injetou mais de 1 trilhão nos últimos anos para tentar salvar a economia da Grécia, Espanha e Itália e a tendência atual é de menos oferta de dinheiro barato, especialmente para um país que quer reduzir a sua austeridade econômica e, consequentemente, as garantias que dará aos seus credores.
A Itália tem uma economia muito grande para quebrar, muito grande para ser resgatada e muito complexa para ser resolvida. Talvez, Infelizmente, os italianos terão que descobrir, como acontece com toda criança mimada, que a “gaiola alemã” ou as broncas do papai e da mamãe são mansas quando comparadas com a realidade do mundo lá fora. A nós brasileiros cabe olhar com atenção para que a gente não caia, de novo, na mesma armadilha.